🤷🏻 Ninguém morreu porque ficou sem X/Twitter
A grande lição: Ele não é mais tão importante quanto fazem parecer
NOTA: Eu sei. Eu prometi que teria uma certa periodicidade nas publicações. Mas você não sabe pelo o que passei. Acho que burnoutei. Entrei em uma leve crise depressiva. Visitei São Paulo, a Mordor Brasileira, e descobri que se o RH de uma multinacional quiser, pode ser a parte mais tosca de uma empresa. Mas estou de volta! Vamos tentar manter a periodicidade, sim?
Enquanto não tivemos newsletter, o blog Hashtag, da Folha de São Paulo, me entrevistou. Pois é. E eu falei tanto, mas tanto, daquele jeito enrolado que só quem acompanhava meus Spaces sabe, que acabou saindo dividida em duas partes. Legal, hein? Deixo os links abaixo para que você confira e veja que não é um delírio (são para assinantes, mas dá teus pulos, fio).
'Marçal venceu as eleições, não nas urnas, mas na economia da atenção', diz Jairme
O Bluesky é uma bolha, mas não julgo quem prefere, diz Jairme
“Diz Jairme” é muito engraçado. Jesus. Meus agradecimentos ao Mateus Camilo pela entrevista.
🤷🏻 Zero mortes por abstinência de Twitter
Após quase 40 dias, o Twitter/X/Xiqueiro de Elon Musk foi desbloqueado no Brasil. E não foi impressão sua: uma gigantesca bola de feno ficou passando em câmera lenta pra lá e pra cá, bem impaciente, no cenário digital brasileiro. Ao contrário do que os mais práticos previam, o bloqueio – muito, mas muito merecido – demorou além do esperado para ser revisto. E grande parte disso se deve ao próprio Porcão Espacial e suas pirotecnias retóricas.

Já os mais dados ao drama acreditavam que o bloqueio seria o estopim para incendiar as ruas, reunindo a atual fragmentada extrema direita em torno de uma pauta única, com resultados imprevisíveis. Insurreição popular. Impacto nas eleições municipais. Impeachment do STF. Outros chegaram a insinuar uma CRISE DIPLOMÁTICA entre o governo Lula e Joe Biden. Sim, crise di-plo-má-ti-ca por causa do Twitter. Tá bom pra você?
Obviamente, nada disso aconteceu. Ninguém morreu por causa disso. Na real, se há algo morrendo junto da própria rede social, é a ideia da importância que ela tem.
🚫 Vexame com CH
Houve uma certa expectativa (em alguns casos, torcida mesmo) em alguns analistas de que as ruas lotariam em defesa dos bandidos que participaram da incitação ao 8 de janeiro da pretensa liberdade de expressão e contra os excessos de Alexandre de Moraes no 7 de Setembro. Esforços não faltaram para isso: caravanas, cancelamento do evento no Rio de Janeiro para transferir o público para São Paulo e até a presença do Pangaré Sem Faixa em carne e osso fazendo seu típico show de vedete, que consiste na maior parte em enrolar a língua e cuspir no público. Elon Musk, o homem mais rico do mundo, preso em seu eterno key hole, podendo fazer qualquer outra coisa com o seu tempo e dinheiro, divulgava entusiasmado as convocatórias para o que, em tese, seria a virada de chave na luta contra o STF. VEM AÍ UM DOS MAIORES PROTESTOS DA HISTORIA…
Deu 45 mil pessoas. Pra mim, uma dúzia desses reunidos já é muito e acende um alerta do perigo à sociedade que a falta de mais SESCs proporciona. Mas para quem costumava arrastar multidões? Pra quem decidiu reunir a nata da Galeria de Vilões da sociedade brasileira? Com igreja no meio e tudo? Na luta contra o Terrível Xandão?
Foi um desastre. E o X seguiu bloqueado.
🤷🏻 A gente se acostuma a tudo?
Eu sei: para nós, heavy users do passarinho azul desfigurado, houve um certo estranhamento ao sermos retirados do nosso habitat natural. Um vazio. Abstinência. A sensação de estarmos isolado do mundo, já que não podíamos mais acompanhar os trending topics e nos informar sobre mais uma pauta que não podemos fazer nada a respeito. A memória muscular insistia em nos fazer tocar no app que não funcionava. E, claro, há os que se atreveram a dar aquela espiadinha sem compromisso do outro lado do muro, apenas para se deparar com um odor mais pútrido que o do Rio Tietê em seus piores dias.
Sério, havia tanta imundície correndo solta no feed durante o bloqueio que nos força a reflexão: o X piorou com o bloqueio do Brasil ou nossa presença servia apenas para perfumar o ambiente por onde escorre tanta nojeira? Estávamos enfiados até os ombros nesse lamaçal o tempo todo? Tá valendo monetizar discurso neonazista? Aparentemente, sim:

Mas nós, brasileiros, reis da gambiarra, nos adaptamos a tudo. Aos poucos fomos nos acostumando, arrumando novos ambientes para socializar, outros chiqueiros para nos jogar na lama. Mesmo quem dependia do Xiqueiro do Musk para trabalhar e viu o bloqueio do X como um entrave, como esse belo rapaz, aparentemente encontrou outras possibilidades. As agências de publicidade que lutaram pra fazer social listening. Vai ter que ler o clipping no e-mail igual a todo mundo em 2006, jornalista! Mas, no geral... Sinceramente, passamos bem sem. Digo, você deixou de saber do Diddygate? Da prisão da Deolane e do Deocamp na porta do presídio Bom Pastor, no Recife? Do quinquagésimo chá de espectro político da Jojo Todynho? Da Lucyborn mostrando mais do que devia?
Perguntei a um amigo, responsável por um importante portal de jornalismo brasileiro, sobre o impacto da ausência do X na sua audiência. Sua resposta foi: já tava bem mal, então não fez diferença. Ou seja… Às vezes, nos desgastamos com uma mídia que não dá o retorno devido.
🤷🏻 O papel aceita tudo: dos fatos à ficção fantástica
É óbvio que a volta do Twitter causou emoções e ereções por aí. No tweet comunicando a suspensão do bloqueio, a plataforma descreveu-se como “indispensável” ao Brasil. Nada poderia ser mais falso. O folclórico colunista do Estadão J. R. Guzzo descreveu o X/Twitter como a mais populosa plataforma de comunicação do país. Só se for na casa dele. Qualquer pessoa que trabalhe com redes sociais sabe que nem de longe o X/Twitter possui essa base. Pra você ter uma ideia, o X/Twitter tem menos usuários que o Pinterest. Não é a mais usada e nem a mais querida. O X/Twitter era a rede de pautar quem pauta. Hoje? Pra ler um comentário de uma pessoa real, você precisa passar por uma dúzia de bots catando moedas (lembre-se que uma das investidas do Musk foi combater os bots e ele acabou piorando a situação).
Vamos comparar com a que, de fato, pode ser descrita como a plataforma mais populosa do país: o WhatsApp. Para você ter ideia, o monstrinho verde da Meta está presente em 99% dos celulares do país que tem mais telefones que pessoas. 93% dos usuários o usam diariamente.
O apagão nos serviços da Meta em 2021, que deixou o WhatsApp fora do ar por quase 8 horas no país, mostrou uma prévia do que seria a catástrofe de um bloqueio do WhatsApp no Brasil. Imagine a quantidade de pequenas, médias e grandes empresas que deixaram de fechar negócios naquele dia. Esses mesmos negócios que, de acordo com o Sebrae, são menos de 30% com canais próprios de venda. Não quer falar de negócios? Tudo bem. Imagine quantas pessoas precisaram voltar a telefonar umas para as outras nesse mesmo dia. Quantas pessoas, habituadas se comunicar apenas por áudios por diversas limitações, ficaram sem poder se comunicar.
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Em que proporção o bloqueio do X/Twitter se compara a isso? Os únicos serviços que pararam de funcionar com o bloqueio do X no Brasil foram as páginas de memes do Instagram, que perderam sua principal fonte de conteúdo (aliás, recomendo o relato da guerra de Marie Declercq contra a página Perrengue Chique) e as “pobres” agências de publicidade, que perderam uma fonte de insights pra justificar ideias, boas e ruins. Há os ilustradores que fechavam comissions através da rede, esses sim, grandes vítimas do Pão Cru Espacial. Além dos produtores de conteúdo adulto. Mas, trazendo a discussão ao macro, percebe que não tem o impacto que os delulus imaginam?
Mas como o papel aceita tudo, houve quem estimasse um prejuízo de QUINZE BILHÕES DE REAIS EM CINCO ANOS com o bloqueio do X/Twitter no Brasil. Sentido nesse argumento e lógica na conta? Nenhum.
🤷🏻 E o que faremos?
Honestamente, eu não consigo criticar quem decide voltar. Por qualquer motivo. Há quem não se adapte às alternativas mesmo. Há quem precise por razões profissionais, como ilustradores, designers, produtores musicais, jornalistas, os nefastos publicitários, profissionais do séquisso. Eu acho massa quem consegue fazer uso racional dos aplicativos de forma ética e ideológica, mas no geral, as pessoas não são assim. Paciência.
Há quem ainda use a plataforma para se comunicar pessoas com os mesmos interesses em todo o mundo para participar de ações articuladas. Eu não acho justo, por exemplo, que as meninas fãs do BTS precisem se isolar do globo no momento de um lançamento. Você achou justo que os fãs brasileiros da Britney Spears ficassem de fora da compra do single Work Bitch no iTunes, só para coloca-lo nos charts na ocasião em que os filhos dela atingiriam a maior idade e seu ex-marido perderia o controle das pensões alimentícias? Eu não achei.
Dito isto, quem usa, precisa saber onde está se enfiando: em uma rede social instrumentalizada pela extrema direita para divulgar ideais extremistas disfarçados de liberdade de expressão, tentar tumultuar democracias (como foi o nosso caso, eeee) e aos poucos ruma ao fracasso total.
Você soube que o valor de mercado do X/Twitter caiu dos $ 44 bi para$ 9,4 bi, uma perda de ¾ do valor de compra? Que a compra da plataforma pelo Musk já é considerada o pior negócio para os bancos desde a Crise de 2008? Que o uso do X/Twitter caiu quase ¼ desde a mudança para X? Que a nova ideia envolvendo inutilizar o botão de bloqueio dentro da plataforma servirá para deixa-la ainda mais hostil? Que a tendência de usuários abandonando a plataforma é global, principalmente na União Europeia e Estados Unidos?
Não sabia? Agora está sabendo.
O pobre Bluesky, que nos acolheu tão bem, e o Threads, que pelo que me entrega no feed só consigo chamar de celeiro de gente tonta, estão recebendo ondas e mais ondas de novos usuários. De regiões onde o X não recebeu bloqueio. Isso indica que as pessoas querem manter o hábito de tuitar, mas não se sentem mais confortáveis com aquele ambiente. Se vão vingar, não sabemos. Mas o que sabemos é que o Twitter morreu mesmo e não param de vilipendiar seu cadáver.
Observe as estatísticas. É esse aí o novo normal do X/Twitter.
💀 Quando uma nova suprema surge, a anterior enfraquece
Diante do naufrágio do X/Twitter, a questão que fica é: qual rede social assumirá (já assumiu) o papel de ser a vanguarda da internet? A que pauta todas as demais? A que dita comportamentos? A resposta é muito clara há pelo menos quatro anos: é o TikTok. Duvida? Por que você acha que os Estados Unidos estão desesperados querendo transformá-lo em uma empresa norte-americana, sob pena de bani-lo do país? Caso Diddy? Irmãos Menendez? Apoio à Causa Palestina? Todos esses tópicos hoje em dia são pautados pelo TikTok, movidos pela primeira geração jovem que não tem vergonha de dançar e de abrir a câmera para se expressar.
Ainda tem dúvida do impacto? Reflita sobre o último vídeo que você assistiu na horizontal e na vertical. E mais, qual foi o último conteúdo nativo do X/Twitter (e vou mais além, do Youtube) que pautou a internet inteira? E qual foi a última vez que você viu um vídeo do TikTok publicado no Twitter e atingindo milhares de likes?
Vá pensando aí.
Pra ouvir
O Felipe Abal, meu amigo íntimo e pessoal e co host do Vira-casacas, publicou em sua coluna em áudio RT Comentado um breve resumo do livro Limite de Caracteres - Como Elon Musk destruiu o Twitter. Ótima oportunidade para você ficar por dentro dos absurdos relatados na obra, mas que está sem condições de dar sem pila em um lançamento agora. Prestigiem.
Se você gostou desta newsletter, me deixe ficar sabendo nos comentários, pelo e-mail oijairme@gmail.com e compartilhe com seus amigos. Não gostou? Pode usar os mesmos canais para descer o pau. Acha que eu preciso de ajuda? Doe. É uma causa nobre. Sabe a multinacional? Eu meio que saí dela…
Concordo muito com o que disse sobre o tiktok, hoje acabo sabendo as coisas primeiro por lá e já tinha notado essa onda de pautas que migram de lá para o twitter. Contudo, ainda continuo no Titanic do Mosca, pois lá é o único meio em que consigo me conectar com a comunidade de fãs de alguns segmentos. Testei o BlueSky, mas ele ainda é um “jovem Padawan”, falta “o povo” chegar também. Enfim, amei o texto. Você como sempre muito lúcida e necessária! 🤍
Jairme, você é um ser único. Ótima newsletter. Eu estou fora do Brasil, mas não aguentei o lixo que ficou o X, já estava ruim, mas alguns você ainda tinha alguns perfis que valiam a pena seguir. Depois do bloqueio só sobrou página de facho, portal de fofoca clickbait e fã clube da Anitta. Desativei minha conta e tirei o app do celular pq por reflexo sempre o abria. Comecei de fato a acessar mais o Bluesky e até agora está tudo bem. Realmente não aguento os textões de gente com sérios problemas pessoais ou gente pedindo edição de fotos do Threads. Aquilo lá é muito estranho. Beijos e até a próxima newsletter.